Santa Gemma Galgani. Diário

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Quinta-feira, 19 de julho

EXPERIÊNCIA DA PAIXÃO COM JESUS

Esta tarde, finalmente, após seis dias de sofrimento pela falta de Jesus, estou um pouco recolhida. Comecei a rezar, como costumo fazer às quintas-feiras. Gostaria de estar ajoelhada, mas a obediência queria que eu estivesse no leito e assim fiz. Pus-me a pensar na crucifixão de Jesus.

Inicialmente não sentia nada. Depois de alguns minutos, me senti um pouco recolhida. Jesus estava perto. Ao recolhimento me aconteceu como de outras vezes: entrei em êxtase e me encontrei com Jesus, que sofreu penas terríveis.

O que fazer vendo Jesus sofrer e não ajudá-lo? Senti, então, um grande desejo de sofrer e pedi a Jesus conceder-me essa graça. Contentou-me logo, e fez como fizera em outras vezes: aproximou-se, tirou de sua cabeça a coroa de espinhos, colocou-a na minha, depois me deixou.

Via, pois, que eu o olhava calada. Entendeu logo um pensamento que me ocorreu naquele momento. Pensei: “Talvez Jesus não me ame mais, porque, quando quer demonstrar o seu amor, aperta bem a coroa em minha cabeça”. Jesus entendeu e, com suas mãos, apertou-a. São momentos dolorosos, mas momentos felizes.

E assim me entretive uma hora a sofrer com Jesus. Desejaria estar sempre, toda noite, mas, assim como Jesus ama tanto a obediência, ele mesmo se submete a obedecer ao confessor. Depois de uma hora, me deixou; quero dizer, ele não me apareceu mais.

Aconteceu, porém, uma coisa que jamais havia acontecido: Jesus costuma, cada vez que põe a coroa em minha cabeça, levá-la quando me deixa. Ontem, ao contrário, deixou-a comigo até perto das quatro horas.

Para dizer a verdade, sofri um pouco, mas não me lamentei uma só vez. Jesus me perdoará se às vezes escapa algum lamento involuntário. Sofri muito a cada movimento: que, depois vi, foi só imaginação.


Reflexão

A espiritualidade da cruz nos coloca junto com Cristo crucificado. Assim nos mostra Santa Gemma Galgani nessa quinta-feira, dezenove de julho, primeiro dia que tem registro em seu diário. Pela forma como ela inicia o relato de sua experiência espiritual nesse dia, tudo indica que já vinha fazendo suas anotações espirituais diárias, mas estas provavelmente se perderam.

A primeira informação que recebemos neste dia de seu diário é que ela vem de um tempo de aridez, de deserto espiritual, e os desertos testam a sua fé. Jesus também esteve quarenta dias e quarenta noites no deserto, onde foi tentado pelo diabo (Mt 4,1-11). Nisso também Santa Gemma quer se assemelhar a ele, num processo de profunda imitação de Cristo.

O deserto de Santa Gemma consiste na falta de Jesus. Quando ela não o sente por perto, sua vida se torna árida. A ausência de Cristo torna árida a vida de qualquer cristão. Afastar-se dele, ou não senti-lo, é uma forma de aridez, ou de deserto espiritual. Para Santa Gemma, foram seis dias de deserto, de vulnerabilidade, que mais pareciam uma eternidade, pois nesses dias as tentações do demônio foram muito fortes. Foram dias de muito sofrimento, como ela mesma relata no diário.

Porém, nesse dia, finalmente, ela começa a rezar e se sente confortada. A oração é o conforto para todos os que se sentem distanciados de Deus, ou em sofrimento.

A sua oração consiste na meditação do Cristo crucificado e, quanto mais ela medita, mais ela mergulha nesse mar imenso do amor de Deus, passando do nada em que se encontrava ao tudo que significa estar perto de Jesus. A oração de meditação de suas dores lhe possibilita estar perto de Jesus. Através da meditação, imaginando as suas dores, ela o visualiza, crucificado.

Encontramos aqui a função primordial da oração: conectar com Deus. Através dessa conexão, tê-lo por perto. Quem reza tem Deus sempre por perto, nos mostra Santa Gemma, através de seus relatos espirituais com as dores do crucificado.

Mas a oração de Santa Gemma não é qualquer oração. É uma oração profunda, que começa singela e termina em êxtase. O êxtase é a característica principal da oração e da espiritualidade de Santa Gemma. Êxtase é quando o humano se amalgama com o divino e o divino possui o humano. Assim, nesse estágio da oração, Santa Gemma está completamente tomada, possuída pela presença de Jesus crucificado.

O êxtase revela o sentimento de compaixão. Com paixão é aquele sentimento em que a dor do outro passa a ser a minha dor. É um sentimento divino, próprio de Jesus, que se compadecia do sofrimento alheio e fazia algo para dirimi-lo, como vemos em vários momentos nos Evangelhos.

Por exemplo:

  • Quando, ao ver a multidão como ovelhas sem pastor, ele sente compaixão (Mc 6,34-44). A compaixão o faz ensinar a seus discípulos e à multidão uma das belas lições que encontramos nos Evangelhos: a lição da partilha.
  • Quando ele se compadece da viúva de Naim, que havia perdido seu único filho (Lc 7,11-17). Ele sente a dor dessa mulher, se compadece dela e ressuscita seu filho, devolvendo-lhe a alegria.

Assim, a dor dessas pessoas era também a dor dele.

Santa Gemma, em êxtase, sente as dores de Jesus. Ela se compadece dele, e as dores de Jesus passam a ser também as dores dela.

Temos aqui um dos pontos altos da espiritualidade da cruz. A espiritualidade da cruz nos ensina a sentir as dores de Cristo crucificado em nós, através da compaixão dos que sofrem as mais diferentes modalidades de cruz. A cruz redime os pecados e as dores através da compaixão.

Diante da dor do Crucificado, Santa Gemma questiona:

“O que fazer vendo Cristo sofrer e não ajudá-lo?”

É esse sentimento, ou questionamento, que deve surgir em nós quando contemplamos Cristo crucificado. Diante da cruz, devemos também perguntar: o que fazer vendo nossos irmãos sendo crucificados, sem poder ajudá-los?

É desse sentimento que surgirão em nós as forças e as ações necessárias para fazer algo para ajudar os que sofrem, diminuindo ou dirimindo seus sofrimentos.

Uma oração que não desperta a compaixão é uma oração que ainda não atingiu a profundidade de que toda oração precisa para chegar até Deus.

Diante desse sentimento divino que é a compaixão, Santa Gemma quer imitá-lo e lhe pede a graça de sofrer como ele sofreu, de sentir suas dores na própria carne.

Começa aqui um relato de profunda sintonia com o Cristo sofredor que somente sente quem se entrega totalmente a ele em oração. Não é o sofrimento pelo sofrimento, mas o sofrimento reparador, em vista da conversão.

Assim, a oração de contemplação, quando atinge tal estado de espírito, provoca uma transmutação simbólica que transfigura a vida da pessoa que ora. Santa Gemma sente Jesus, que se aproxima dela e partilha da sua coroa de espinhos. Ela recebe a coroa em suas mãos. Ele a coloca em sua cabeça, e ela sente os espinhos penetrando a sua carne.

Esse participar das dores de Cristo a faz sentir parte dele. Ela está agora nele e ele nela.

Santa Gemma permaneceu quatro horas com a coroa de espinhos encravada em sua cabeça. Foram quatro horas de participação intensa nas dores de Cristo, as quais faziam dela uma extensão dele. Assim, Jesus se foi da presença dela, mas deixou sua coroa para que ela não se esquecesse de suas dores, nem das dores de todos os sofredores, daqueles pelos quais ele tanto sofreu.

Cada vez que vemos a coroa de espinhos, ela deve servir de sinal para não nos esquecermos dos que continuam a receber em seus corpos as chagas de Cristo crucificado. Dos que continuam a receber em suas cabeças a coroa de Cristo crucificado.

Neste dia, em seu diário, Santa Gemma nos ensina a sofrer com aqueles que sofrem; ela nos ensina a ter compaixão a partir da Paixão de Cristo.

Toda vez que tivermos diante de nós um dos símbolos da Paixão de Cristo, como a coroa de espinhos, nós devemos nos lembrar dos que sofrem. Que cada dor de nossos irmãos seja um espinho na nossa carne, como foi a coroa de espinhos de Cristo para Santa Gemma Galgani.

Assim, não nos omitiremos diante das dores do mundo e faremos algo para ajudar os crucificados de todos os tempos.

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